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segunda-feira, 17 de agosto de 2015

Ajo Blanco [ ou a Frugalidade de uma Sopa Fria Andaluz ]

A sugestão de hoje é um hino à frugalidade alimentar e, quem sabe, um desafio para repensar a forma como comemos actualmente.

Nunca antes como no século XX o mundo vira mudanças tão profundas no paradigma alimentar que alteraram por completo a nossa percepção dos alimentos e da alimentação.
Ao longo dos últimos 70 a 80 anos quer o desenvolvimento de novas técnicas agrícolas, industriais e tecnológicas quer a criação de vias de comunicação mais eficientes ajudaram a redefinir e moldar a alimentação contemporânea.

E num mundo em paz relativa, cujas economias globais estão alicerçadas no capitalismo, como é que isso afecta o que, como e quanto comemos?

O conceito de globalização moderno enraizou nos nossos hábitos de consumo alimentos de países distantes e que hoje não dispensamos nas nossas cozinhas, exemplo por excelência disso mesmo são as centenas de especiarias que nos ajudam a dar sabor aos alimentos e sem as quais seria difícil viver hoje (apesar do termo "globalização" ser relativamente recente, não teria o conceito nascido já nos séculos XV e XVI com os Descobrimentos, quando se começaram a introduzir alimentos desconhecidos de outros continentes na alimentação dos países colonizadores?).
O consumo de proteínas animais como a carne e o peixe banalizou-se, nos países mais ricos, ao ponto de os podermos consumir diariamente, vegetais, frutas e cereais passaram a ter um papel secundário nas dietas alimentares modernas - recordo o que a querida avó me contava sobre a alimentação da sua juventude, os cereais (usualmente na forma de pão), os legumes e a fruta eram a base alimentar diária, a carne era o luxo de datas santas e o peixe de mar uma delicatesse escassa nos pratos dos mais pobres do interior do país.
E porque o mundo vive uma paz relativa há várias décadas, tornou-se possível canalizar recursos alimentares em abundância para as mesas dos cidadãos comuns dos países onde a riqueza está mais concentrada. As porções individuais do que comemos aumentaram exponencialmente e até o tamanho dos pratos aumentou também (já tinha reparado nisso?). 

Mas numa altura de tamanha abundância alimentar, significará isso que o que comemos hoje é tão ou mais seguro para a saúde humana quanto o que se comia há pouco mais de meio século atrás? Penso que todos conhecemos a resposta a esta questão.

A receita que trago hoje obriga-nos a repensar todos estes aspectos da História da Alimentação, até porque esta Sopa Fria Andaluz tem a sua história intimamente ligada a um período de escassez alimentar espanhola.
Málaga e Granada disputam a origem desta receita, mas certo é que esta sopa humilde (cuja combinação de ingredientes remonta à antiguidade da conquista romana da Península Ibérica) se tornou prato nacional durante a Guerra Civil Espanhola e nos anos do pós guerra.

Este Ajo Blanco (uma alternativa ao famoso Gaspacho) combina ingredientes tão frugais como Pão, Água, Amêndoas, Alho, Azeite, Vinagre e Sal e posso garantir-vos que basta apenas uma chávena pequena desta sopa acompanhada por algumas frutas doces para encher a barriga e saciar a alma até à próxima refeição. De sabor intenso e textura densa, esta sopa fria leva-nos a uma época em que a saciedade do corpo não estava (nem podia estar) ligada à quantidade do que comíamos, mas antes à cozinha de economia, onde a combinação de ingredientes dependia do que havia e do que não se podia desperdiçar.

Aceite a nossa sugestão de hoje e experimente este incomparável sabor andaluz, dê um boost ao seu sistema imunitário com a ajuda do alho crú e viaje no tempo até uma altura em que a frugalidade na altura de comer não podia, como hoje, ser uma opção.




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Nº Pessoas: 8
Tempo Prep.:  30 min.
Dificuldade: * (Fácil)
Ingr. Principal: Pão
Vegetariano: Sim
Para Crianças: Sim *
Tipo Prato: Sopas
Festividade: N/A
Cozinha: Espanhola

* Apesar dos ingredientes desta sopa serem adequados para crianças, desaconselho-a a crianças mais pequenas devido ao sabor intenso do alho

Ingredientes: 
- 150 gr de Miolo de Amêndoa (sem pele)
- 200 gr de Pão duro
- Água fria q.b.
- 2 dentes de Alho (sem o Gérmen)
- Azeite Virgem-Extra de baixa acidez e óptima qualidade
- 3 colheres de chá (rasas) de Vinagre de Jerez
- 2 colheres de chá (rasas) de Sal Marinho + 1 colher de chá (rasa) para corrigir no final, se necessário
- Uvas frescas a gosto (escolha uma variedade doce, como p. ex. Moscatel) ou pequenos rectângulos de Melão doce
Opcional Não-Vegetariano:
- Fatias finas de Presunto a gosto

Também vai precisar de:
- Frigideira anti-aderente pequena
- Robot de cozinha
- Tábua de corte + Faca
- Chávenas ou copos pequenos para servir
 
Preparação:
Aqueça uma frigideira anti-aderente em lume médio/ alto e quando estiver bem quente junte o miolo de amêndoas. Deixe torrar levemente em lume baixo/ médio, agitando a frigideira com frequência para que não queimem. Assim que estiverem levemente douradas, retire as amêndoas da frigideira e deixe arrefecer completamente. Reserve.

Parta o pão em pedaços pequenos para o copo do robot e adicione um pouco de água fria. Assim que o pão tenha absorvido toda a água, junte as amêndoas torradas e os dentes de alho (a que previamente retirou o gérmen, utilizando a técnica explicada na dica 1 desta receita). Reduza tudo a uma pasta fina e homogénea.

Tempere com um fio generoso de azeite virgem-extra, o vinagre de Jerez e o sal. Volte a triturar tudo na velocidade mais baixa e adicione água fria em fio, aos poucos, até obter um creme suave, nem muito líquido nem muito espesso. Prove e corrija o sal se necessário, voltando a emulsionar tudo em velocidade reduzida. Deixe refrescar no frio.

Sirva bem gelado em chávenas ou copos pequenos, com algumas gotas de azeite no topo, uvas ou melão bem doce e fresco e, se não for vegetariano, umas fatias finas de presunto à parte.

 
Bom Apetite!

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